Fonte dos desejos

Cartas para Ana - 1

São Paulo, 2025

Oi,
Eu não sei nem como começar, porque faz tanto tempo que a gente não se fala.
Eu sinto que você ficou lá atrás, num tempo em que eu ainda me sentia viva.
Você era… forte de um jeito frágil.
Tinha brilho nos olhos, mesmo depois do choro.
Você sonhava alto, ria de verdade, amava com todo o peito.
Você dançava com os dias, mesmo quando o mundo pesava.
E eu?
Eu tenho me arrastado.
Tenho fingido que está tudo bem quando, na verdade, tem algo em mim gritando por socorro em silêncio.

Sinto que fui me afastando de você a cada vez que precisei ser forte demais.
A cada vez que me calei. Que me abandonei. Que deixei os outros passarem na frente.
Eu sei que te decepcionei.
Eu te deixei pra trás.

Mas a verdade é que eu precisei sobreviver.
E, pra isso, eu me apaguei.

Não foi por mal.
Foi por medo.
Foi por exaustão.

Mas hoje, no meio do choro que veio do nada — ou de tudo — eu te senti de novo.
Você ainda vive aqui, não é?
Quietinha, num canto do peito.
Talvez magoada comigo, talvez assustada.
Mas viva.

Eu não prometo reencontrar você de um dia pro outro.
Eu nem sei mais como se faz isso.
Mas queria que soubesse:
eu tô tentando voltar.
Talvez eu nunca volte a ser exatamente você…
Mas posso te acolher no que sou agora.
E quem sabe a gente possa construir uma versão nova, nossa, com pedaços de tudo o que fomos.
Com mais dor, sim. Mas também mais verdade.

Eu não deixei de te amar.
Eu só esqueci como era se amar.
Mas estou reaprendendo. Aos poucos. Com cuidado.

Fica aqui comigo?

Com amor,
De alguém que está voltando pra si.



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